Jornal Republicano – Órgão Regionalista das Beiras – Há 93 anos a informar
Fundador: 
Adriano Lucas (1883-1950)
Diretor "In Memoriam":  
Adriano Lucas (1925-2011)
Diretor: 
Adriano Callé Lucas

Diário de Coimbra retomou publicação há 70 anos após mais de um ano de suspensão imposta pelo regime salazarista


Segunda, 11 de Julho de 2016
Ditadura A censura do Estado Novo veria afrontas a Salazar num artigo do jornal, mantendo-o encerrado por mais de um ano Completam-se hoje 70 anos que o Diário de Coimbra retomou a sua publicação depois de ter sido suspenso por mais de um ano pela ditadura do Estado Novo. Por causa de um artigo - “Max, artista de circo” - sofreu a mais grave penalização aplicada pelo regime de Salazar a um jornal diário nacional, ficando suspenso desde 7 de Julho de 1945 a 11 de Julho de 1946. Poucos serão os jornais e as empresas que resistiriam a um encerramento forçado por mais de um ano, sendo praticamente certo, pela análise da documentação da época, que a intenção era fazer desaparecer o jornal, que vinha publicando, na coluna “A Cidade”, artigos sobre escassez de água, pão, batata ou peixe, assuntos que não interessavam ao regime. Todavia, o Diário de Coimbra contou então com a persistência do seu fundador Adriano Lucas (Adriano Viégas da Cunha Lucas, 1883-1950) conseguindo regressar às bancas. Foi o próprio filho Adriano Mário da Cunha Lucas (1925-2011) que então já figurava como editor (e que viria a liderar o Diário de Coimbra durante mais de sessenta anos, desde a morte do seu pai em 1950 até 2011) que diria, por mais de uma vez, que se não fosse a força de vontade de seu pai o jornal não voltaria a ser publicado, tantos foram os entraves colocados à reabertura. “Max, artista de circo” O artigo que originou a punição até tinha sido visado pela censura. Publicado a 29 de Junho de 1945, sem assinatura do autor, aproveitava uma música então em voga – Max do Trapézio Voador – para contar a história de ”Max, artista de circo” (título do artigo). Falava de um trapezista genial que foi perdendo fulgor físico e acabaria por fazer outras habilidades, mas sem o êxito de outrora. Foi contorcionista, a meter-se inteirinho numa caixa de chapéus, a trocar os pés pelas mãos (...) e a fazer coisas só possíveis a uma pessoa sem coluna vertebral. Inconformado e com memória das grandes aclamações, pensou voltar ao trapézio. E numa noite preparada para o efeito, o mestre da barra voltou ao trapézio perante uma casa cheia. Só que, sem forças, as suas habilidades roçavam o ridículo. Até que um dia, quase sem público, caiu e morreu. No dia seguinte, “nem o empresário o foi ver à Morgue...” Suspensões sucessivas do jornal Para a Censura o artigo foi interpretado como uma crítica directa a Salazar. Max só podia ser o então reitor da Universidade de Coimbra, Maximino Correia e o empresário/mestre do circo teria de ser Oliveira Salazar, que deixaria cair sem contemplações quem já não lhe conviesse. O Diário de Coimbra tinha então 15 anos de publicação, com princípios que ainda hoje se mantêm, como Jornal republicano (como, então e agora, ostenta na primeira página) liberal e regionalista, defensor da democracia pluralista e da Liberdade da Imprensa. Em 1945, apesar do final da guerra, o regime endureceu e tais princípios causavam incómodo e até afronta à ditadura. O artigo ”Max, artista de circo” seria o pretexto do governo para tentar calar o jornal. Os exemplares impressos do Diário de Coimbra foram apreendidos nessa manhã e foi aplicada ao jornal uma suspensão de 20 dias, com a exigência de substituição do director. Mas todos os nomes que foram sendo indicados para a Direcção foram sucessivamente rejeitados, dado que o regime impunha que os directores dos jornais fossem previamente aprovados pela Censura. Foi-se dilatando assim, sucessivamente, a suspensão do Diário de Coimbra. Em carta dirigida ao filho, Adriano Viégas da Cunha Lucas dava conta da sua indignação: “Continua a perseguição, torpe e injusta contra o Diário de Coimbra. Da censura deram ordem para o Francisco Pimentel [indigitado para director] e o Soares [para editor] apresentarem os documentos. E o presidente da Comissão (de Censura) daqui acrescentava saber que seriam aprovados. O jornal já deveria ter reaparecido – estava isso assente – no princípio desta semana. Afinal, telefonaram-me ontem dizendo--me que de Lisboa viera novo ofício da censura informando que o Francisco Pimentel havia sido rejeitado! Não há direito! Isto já passa de enxovalho e de garotice! Sinto-me revoltado! E vejo-me desacompanhado de quem se poderia opor. Estou a ver que isto já não poderá acabar em bem”. Na missiva, Adriano Viégas da Cunha Lucas fazia ainda um pedido ao filho Adriano, que estudava então no Instituto Superior Técnico: “Peço-te que procures o J. P. em Lisboa para que te informe, de uma vez para sempre, se há intenção, lá do alto, de acabar com o Diário de Coimbra, rejeitando, sistematicamente, toda e qualquer pessoa da minha escolha. É preferível um desengano leal a continuar esta fantochada”. A mais grave penalidade aplicada a um diário português só terminaria com uma alegada intervenção de Bissaya Barreto junto de Salazar. Apesar de apoiante do regime e próximo de Salazar, Bissaya Barreto respeitava o Diário de Coimbra e Adriano Lucas, de quem fora amigo e sócio. Tinha participado como sócio durante o primeiro ano da fundação do jornal, em 1930, e tinham ambos partilhado a primeira vereação republicana da Câmara Municipal de Coimbra, em 1910, presidida por Sidónio Pais. O Diário de Coimbra regressaria às bancas efectivamente a 11 de Julho de 1946 (na edição n.º 5111) com um novo director aceite pela Censura, o capitão António Dias, apresentado como “publicista infatigável, militar distinto e causídico competente”. Foi o amor ao jornal de muita gente que o fez resistir: desde logo do seu fundador e proprietário Adriano Lucas, mas também dos trabalhadores que aguentaram a incerteza, dos leitores e assinantes que não desistiram, de anunciantes que o reafirmaram, de correspondentes, agentes… De muitos Amigos.|
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Tasca do Ronaldão



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