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Memórias da Queima / Fernando Gama: O Dux que fez um decreto para a Rita Lee atuar de capa e batina (com vídeo)


Quinta, 02 de Maio de 2024

Fernando Gama acedeu ao nosso convite e levou-nos a uma pequena visita pelo interior do edifício da Associação Académica de Coimbra (AAC). Já lá vai o tempo em que aquele emblemático prédio, no início da Rua Padre António Vieira, era casa onde passava «quase 24 horas» e local de amizades, tertúlias e algumas polémicas. Agora, é apenas espaço de memórias para este antigo estudante da Universidade de Coimbra, que foi Dux Veteranorum entre 1993 e 1997.
«Durante a Queima, nunca eram menos de 8 a 10 horas por dia», conta ao Diário de Coimbra, a caminho da sala do Conselho de Veteranos, escolhida por si como o local mais marcante da sua passagem pela Universidade de Coimbra. Ou não tivessem passado por ali, em particular durante a Queima das Fitas, «tantas decisões, subornos recusados, tertúlias, amizades, discussões e até comissários demitidos»...
Fernando Gama, tal como Pedro Cabral, seu antecessor como Dux Veteranorum, é obreiro de uma transformação na organização da Queima das Fitas, ao ser um dos responsáveis pela criação do regulamento que permitiu organizar o evento e terminar com uma época negra a nível financeiro, que lhe dava «uma péssima imagem».
Claro que, conta, como em todas as ruturas, também aqui o processo não foi pacífico e trouxe um grande clima de tensão entre o Conselho de Veteranos, que ganhava responsabilidades, e a Direção Geral da AAC, que perdia regalias. De tal maneira que, como poucos saberão, fez cair o projeto de transformar a Queima das Fitas numa Fundação, que chegou a dar alguns passos durante os anos 90. «Ainda funcionou durante dois anos, talvez, mas acabou por não ter continuidade porque mexia com vários interesses instalados», confirma Fernando Gama.
Com mais ou menos polémicas, a Queima das Fitas, que poderia até ter acabado devido a avultados prejuízos no início dos anos 90, viveu depois anos muito felizes, com algumas das mais importantes figuras a fazerem questão de estar presentes no Baile de Gala: «de ministros ao Presidente da República, e até o bispo...», enumera Fernando Gama, recordando, entre risos e a este propósito, o ano em que o convite ao bispo de Coimbra para participar no Baile de Gala foi extensível «à sua esposa».
Se o glamour era a palavra de ordem no Baile de Gala, pelo Parque Dr. Manuel Braga passavam grandes nomes e viviam-se grandes momentos. Fernando Gama recorda os Stanglers, mas destaca como ainda mais importante a Rita Lee, que o obrigou, como Dux Veteranorum, a criar um novo decreto...
«Ela fazia questão de atuar de capa e batina, de apresentar-se de capa e batina em palco, o que era impossível pelas leis do Código da Praxe. Vieram pedir-me para publicar um decreto a autorizá-la especificamente a ir a palco de capa e batina», recorda Fernando Gama, que foi, então, o responsável pelo documento.
«Foi muito engraçado», acrescenta... Menos engraçada, apesar de tudo, foi a vez, também já recordada por Pedro Cabral, em que o palco caiu com os Xutos e Pontapés a fazer o sound-check e, mais insólita foi a noite em que em pleno palco do Parque da Cidade, numa noite de Queima, o foram avisar que «os elementos de uma banda estava a tocar nus, com um frango pendurado na parte da frente com uma corda atada ao pescoço».
«Cortou-se o som, mas eles continuaram a tocar e o público também não queria que eles fossem embora», recorda.
«Foi muito complicado tirá-los do palco», confessa, agora entre risos. Na altura, o então Dux Veteranorum não achou tanta piada...
Todos momentos marcantes - «e alguns inconfessáveis» - de uma história com 125 anos que merece ser contada. Aliás, Fernando Gama é defensor da criação de «um livro branco» no qual vários protagonistas pudessem «contar uma história engraçada» relacionada com a festa. «Hoje fazem-se livros por tudo e mais alguma coisa... em vez de um livro negro, com as desgraceiras, devíamos ter um com memórias felizes, com a parte boa da Queima», defende o antigo Dux Veteranorum.
A visita ao edifício da AAC foi curta demais para o tamanho das memórias que Fernando Gama tem de uma festa que, neste momento, já não é a sua, mas que, como confessa, gostaria que se mantivesse para a História, pelo menos mais 125 anos. |

A cidade parava e até os patrões davam tolerância de ponto para ver o cortejo


Fernando Gama está um bocadinho arredado das vidas académicas. Até porque não concorda com as “modernices” que agora se aceitam como tradição, como os banhos de cerveja durante o cortejo ou os estudantes transformados em «empregados de mesa» que «deixam a capa, o colete e a batina em tudo quanto é sítio e andam só com a sua camisinha», critica. No seu tempo, isso era impensável. No seu tempo, Coimbra vivia a Queima das Fitas com muita intensidade. «A cidade parava», recorda, falando numa «semana em que a vida da cidade era feita em função das diversas iniciativas que a queima tinha, em que o cortejo era à terça-feira e a cidade parava para o ver».
«Todas as lojas davam tolerância de ponto à tarde para que os funcionários pudessem ir ver o cortejo, vinham pais de fora, era grande o movimento nos restaurantes e até a polícia tinha mais tolerância com os estudantes» que «lhes roubavam um boné» ou «lhes faziam uma brincadeira». Aliás, recorda Fernando Gama, era a Guarda Fiscal que fazia os transportes durante a Queima, nomeadamente os artistas estrangeiros que tocavam no Parque da Cidade.





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